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Tentava há pouco me lembrar há quantos dias estamos em quarentena. Pelos meus cálculos, esta deve ser a terceira semana. Preciso anotar para não esquecer - este é um risco que começo a sentir agora.
Eu poderia consultar o site do governo a qualquer momento, é certo, mas assim eu deixaria de me ater à realidade - a memória conta sempre a história mais verdadeira quando precisamos conhecer as pessoas como elas são de fato.
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Ontem uma amiga me falou que ganhamos, com a reclusão, a oportunidade de lançar um olhar mais delicado sobre as coisas. Agora há tempo para demoras, contemplações e gentilezas.
Eu entendo o que ela quis dizer. Sinto-me um pouco assim.
Não pude deixar de pensar porém, com uma certa vergonha, em nosso privilégio. Moramos à beira do campo, em casas com jardim, quintal e pouca gente. Podemos ser espaçosos.
E cada qual, nos labirintos da sua biblioteca, encontrou afortunadamente alguma alma mais valente que a sua, com quem aprendeu a não desviar o olhar de nada, isto é, a encontrar refúgio na própria imaginação.
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